sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Nem tudo é maravilhoso ,na cidade maravilhosa

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Linha do Trem da cidade do Rio de Janeiro
O blog Histórias das Ruas foi até a cidade do Rio de janeiro. Cidade conhecida internacionalmente como “cidade maravilhosa”.
Desigualdade e pobreza são normais de se ver em qualquer lugar do mundo, tanto nas grandes como nas pequenas cidades, porém, a cidade “maravilhosa” esconde muito mais do que isso. Não precisei sair da zona de conforto, zona Sul, local onde abriga as lindas praias de Copacabana e Leblon, para me deparar com moradores de rua e prostituição. Prostituição essa, que se torna um turismo para os estrangeiros que visitam o Brasil. Algo que me chamou muito a atenção também foi que nessas próprias praias, tirando seus olhos  do lindo mar que as banha e mudando um pouco a direção do olhar já é possível se avistar favelas e comunidades que tomam conta dos morros, que até então eram para ser preservados. Saindo dessa zona de conforto, do luxo e boas aparências, não muito longe dali (para ser mais exato, 20 minutos) já consegui ver a miséria se destacando no meio de todos os prédios e casas. A sujeira que muitas vezes está sob nossos pés se mistura com uma desorganização totalmente perceptível.
Levando em consideração que a zona Sul representa apenas 10% de toda a cidade do Rio de Janeiro, fui atrás de conhecer os outros lugares da cidade, e o que vi e presenciei não foi nada bom.
Pela viagem de trem que realizei, ao olhar pela janela, em uma diferença de cinco minutos eu conseguia avistar uma favela, casas bem destruída com condições precárias de moradia. Favelas essas que não acabavam e que tomavam contam de toda a paisagem que era para ser proporcionada. Pelo caminho dos trilhos, passei também embaixo de uma ponte onde pude avistar usuários de drogas morando lá. 

Entrada dos prédios abandonados onde as famílias vivem.
Chegando a Campo Grande, zona Oeste do Rio, fui ao encontro de uma comunidade que vive em prédios abandonados no meio de muito lixo. Um prédio antigo que os próprios moradores disseram que tem a possibilidade de cair a qualquer momento. Ao chegar nesses prédios de aparência realmente assustadora, a comunidade estava reunida, todos sentados em roda e ouvindo as palavras de uma pastora. Nesse momento, sentei e esperei o fim do culto que eles estavam participando. Nessa espera, um membro dessa igreja veio falar comigo e em vários minutos de explicação do que eles estavam fazendo lá, ele sempre destacando que o seu maior medo era que aquelas crianças, um dia, se tornassem ladrões e que o roubassem. Superficial ou não, continuei esperando para poder conversa com os moradores. Vi algo que me entristeceu muito, fotos e mais fotos sendo tiradas para divulgar o trabalho daquela igreja, como uma forma de mostrar “OLHA O QUE ESTAMOS FAZENDO PELOS MENOS FAVORECIDOS!” e não pelo simples prazer de ajudar aquelas pessoas.
Os moradores me receberam muito bem. Sentei no meio de todos eles, com diversas crianças e mães que queriam me contar como que era viver naquela situação. Quando ia começar a conversa fui interrompido pela pastora que em um tom muito arrogante perguntou qual era a minha formação acadêmica para estar lá fazendo perguntas para eles. Fiquei impressionado com tamanha autoridade que ela tentou utilizar diante de uma pessoa que ela nem se quer sabia o real motivo de estar ali. Deixando as situações adversas de lado, fui logo começando a conversar com várias pessoas.
Crianças da comunidade.
O prédio se encontra naquela situação a mais de 8 anos, e há 8 anos vivem pessoas lá.
Indiara, uma mulher que aparentava ter no máximo 35 anos me contou que antes de todos irem morar nesse prédio, eles viviam nas proximidades, mais precisamente na Favela do Barbante. Boa parte dessa favela teve que ser desabrigada, pois o seu terreno foi usado pela prefeitura para construir novos prédios. Ela conta que quando saíram de seus barracos  “A prefeitura nos disse que ia nos oferecer um auxílio, uma ajuda, e até hoje nada foi feito. Hoje vivemos aqui nesses prédio com mais de 100 crianças, algumas estudam e outras não. Dependemos de uma quantia mínima que é oferecida pela Bolsa Família e da ajuda de outras pessoas.”
Pude percebe que a quantidade de crianças que vivia lá era realmente muito grande. Elas brincavam em meio a muito lixo. Perguntei para as mães que estavam conversando comigo qual era o sentimento delas ao ver seus filhos vivendo naquela situação e a resposta foi a esperada, “Temos indignidade de ver essa situação toda acontecendo, vergonha de estar passando por isso, mas por necessidade moramos aqui. Acabamos nos acostumando com tudo isso, mas sem dúvida o nosso maior sonho é sair daqui e poder ter uma casa decente para morar.” Uma outra pergunta foi feita a todos e com risadas a resposta foi dada:
Como vocês fazem com as suas necessidades fisiológicas e banho?
- “(RISOS) Fazemos tudo em saquinho, não temos saneamento básico. O banho nós tomamos da agua que tem no rio. É suja, mas é o que temos.”
Menino de 14 anos que vive na comunidade e sonha em ser médico.
Chocado com aquela situação perguntei sobre a questão de violência dentro daquela comunidade para uma das mulheres que estava na roda e a resposta não foi nada positiva, “Hoje está bem sossegado. Alguns meses atrás tentaram estuprar minha sobrinha de 5 anos, a sorte foi que ela acordo e começou a gritar, mas mesmo assim ela foi agredida com socos na cara antes do cara fugir. Outro caso também foi do meu filho de 11 anos em uma situação que outro menino mais velho se aproveitou dele.” Antes mesmo de eu começar a perguntar mais, uma outra mulher me interrompeu e quis contar o seu caso, “Já fui abusada também dentro de minha própria casa. Era noite, já estava dormindo e acordei com um homem desconhecido em cima de mim com uma faca tentando abrir a minha calça. Depois de muita luta eu consegui acordar os meus vizinhos e ele foi pego. Hoje não durmo mais, troco a noite pelo dia, tenho medo de que ele volte para tentar me matar.” Contaram também que é normal carros pararem a noite onde as crianças ficam brincando para oferecer dinheiro a elas em troca de favores sexuais. Em desabafo uma mãe disse, “Pensam que só porque somos pobres e vivemos assim nós vamos nos vender por qualquer coisa.”
Depois de ouvir as mães, comecei conversar com as crianças e perguntei se eles sofriam muito preconceito por viver lá e um menino de 14 anos respondeu, “Sim, na escola sempre tiram sarro da minha cara falando que vivo em um barraco, me chamam de pretinho. Fico triste.” O mesmo menino também disse que o seu sonho era ser médico. 

Quarto de uma das famílias. Sujeira e condições
ruins para se viver.
Outras crianças tinham sonhos como, ser bombeiro e professores. Sonhos estes que nem sempre vão se realizar, não por falta de vontade e sim por falta de oportunidade.
Depois de conversar com eles, pedi para conhecer dentro de onde eles moravam. O que vi foi realmente chocante. Muita umidade, paredes caindo aos pedaços, móveis velhos e um cheiro muito forte. Animais dividem espaço com eles.
Percebi em toda a nossa conversa que em todas as situações que eles me contavam, ao mesmo tempo eles riam de tudo isso, riam de um jeito louco. Rindo como uma forma de desespero. Uma das mulheres disse que é só rindo para não chorar, só que talvez o riso de todos seja um choro desfaçado. 
Pessoas vivendo em situações de risco, crianças brincando em meio ao lixo onde existem muitas doenças  e tudo isso sendo encarado como “normalidade”, onde tudo, na verdade era para ser encarado como um extremo absurdo.
Milhões de reais sendo gastos em obras para a copa do mundo, quando milhões de pessoas precisam sair da pobreza que toma conta da maior parte da cidade.
Fui embora com a certeza de que a cidade maravilhosa não é tão maravilhosa assim para quem vive o verdadeiro Rio de Janeiro.

Ainda temos a ida para o Lixão, que traz relatos e histórias bem mais chocantes... Aguardem! 

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